domingo, 5 de julho de 2015

FILME "OSVALDÃO"

O universo do filme “Osvaldão”
Por Osvaldo Bertolino
Um dos mais importantes dirigentes da Guerrilha do Araguaia, Osvaldo Orlando da Costa, comandante do Destacamento B e membro da Comissão Militar, chega às telas do cinema. Produzido a partir de imagens em movimento e sonorizadas do guerrilheiro, o filme “Osvaldão” percorre sua trajetória, revelando sua vida e obra.
O filme “Osvaldão”, que será exibido na 38º Mostra Internacional de Cinema, é o mais completo documento, até agora, sobre o lendário comandante do Destacamento B da Guerrilha do Araguaia. Concebido a partir do documentário “Encontro na antibabilônia”, realizado na ex-Thecoslováquia em 1961 com a participação de jovens brasileiros que estudavam no país — do qual Osvaldo Orlando da Costa, o Osvaldão, é o principal protagonista —, a obra abrange a trajetória do guerrilheiro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) desde a infância até sua morte nas selvas do Sul do estado do Pará.
“Encontro na antibabilônia”, que estava arquivado na República Theca, foi resgatado por Eduardo Pomar (filho do histórico dirigente comunista Pedro Pomar e participante da obra) e Ruy Alves (outro integrante do grupo de estudantes brasileiros da época), e gentilmente cedido à Fundação Maurício Grabois. O desafio era dar ao documentário uma configuração que permitisse a sua ampla divulgação. Com o complemento do material reunido pelos diretores e produtores do filme, surgiu a ideia de realizar um longa-metragem. Com as principais cenas de “Encontro na antibabilônia” inseridas na trajetória do filme, a história ganhou um enredo que combina cenas históricas com as das filmagens recentes.
Verdadeiro diamante
Adalberto Monteiro, presidente da Fundação Maurício Grabois, afirma que a Guerrilha do Araguaia, mesmo com tudo o que já foi escrito e falado a respeito, ainda tem muito por revelar.  “Depois de ‘Camponeses do Araguaia — a Guerrilha vista por dentro’, a Fundação volta a participar dessa obra como produtora de audiovisual porque entendemos a importância de divulgar fatos da principal resistência à ditadura dos generais”, diz ele. O senso de oportunidade e a escolha acertada de parcerias, revela Adalberto, resultaram no sucesso dessas obras. Nos dois casos, segundo ele, as coincidências levaram à produção de filmes fundamentais para ampliar o conhecimento sobre a Guerrilha do Araguaia.
No caso do primeiro documentário, lembra o presidente da Fundação, a ideia surgiu de uma “sacada rápida”, quando chegou a informação de que uma caravana da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça julgaria, em São Domingos do Araguaia (PA), casos de camponeses vítimas de violências da repressão. Imediatamente uma equipe de filmagem e reportagem foi enviada para o local. “Seria uma oportunidade única para colhermos depoimentos de pessoas do povo que participaram de um jeito ou de outro daquele acontecimento histórico”, diz Adalberto Monteiro. Para ele, com o documentário “Encontro na antibabilônia” ocorreu a mesma coisa — seria outra oportunidade única para se conhecer mais a Guerrilha do Araguaia.
Ao se deparar com o “verdadeiro diamante” trazido por Eduardo Pomar, afirma o presidente da Fundação Maurício Grabois, surgiu a ideia do filme “Osvaldão”. “Não tivemos dúvidas de que a partir daquele diamante que o Eduardo Pomar nos trazia era possível fazer um filme sobre a vida desse herói revolucionário negro, um dos mais destacados combatentes da Guerrilha do Araguaia”, afirma. “Para que o projeto se tornasse realidade, a Fundação se associou a uma ‘tribo’ de jovens cineastas (os diretores Vandré Fernandes, Ana Petta, Fabio Bardella e André Michiles) e, assim como ocorreu com o documentário ‘Camponeses do Araguaia — a Guerrilha vista por dentro’, deu muitíssimo certo”, comenta. “Temos a convicção de que o público vai aplaudir com entusiasmo também o filme ‘Osvaldão’”, concluiu.
Personagem antológico
O diretor Vandré Fernandes comenta que ao tomar conhecimento do conteúdo do documentário “Encontro na antibabilônia” imediatamente pensou na possibilidade de ampliar a história para um longa-metragem. A ideia amadureceu e ele se lançou na busca de informações sobre a infância e a fase guerrilheira de Osvaldão. Para dar conta da tarefa, agregou outras pessoas ao projeto, formando o que passou a se chamar, ludicamente, “Coletivo Gameleira” — uma alusão à localidade onde estava a base do Destacamento B da Guerrilha do Araguaia, que fora comandado por Osvaldo Orlando da Costa. Segundo Vandré, a pesquisa revelou um líder nato, com carisma e consciência política perceptíveis desse a sua infância e adolescência.
Vandré Fernandes avalia que o filme revela três “viradas” de Osvaldão: de homem para líder (pendor já manifestado nos tempos de estudante da Escola Técnica Nacional, no Rio de Janeiro), de líder para comandante (na Guerrilha do Araguaia) e de guerrilheiro para “mito”. Segundo ele, em “Encontro na antibabilônia” Osvaldão se revelou um personagem antológico, que mostrava a face e o sorriso de uma figura histórica, em carne e osso nas filmagens, ganhando voz e movimentos. Ao explorar o tema, revela, descobriu com familiares um tesouro até então oculto, contendo cerca de 200 fotos, cartões postais e cartas de Osvaldão. A maior dificuldade que encontrou, diz o diretor, foi contar a "fase guerrilheira". “O filme é cronológico e ao chegar ao Araguaia nos deparamos com o ‘lado B’ do filme, porque todo o material está em poder dos militares”, revela.
Segundo o diretor, a história mostra Osvaldão no mesmo patamar, em termos de bravura e heroísmo, dos lendários guerrilheiros urbanos Carlos Lamarca e Carlos Marighella. Com a diferença de que o guerrilheiro do Araguaia deixou raízes fundas na região, uma figura até hoje reverenciada pelos moradores locais. “Sem desmerecer os dois grandes ícones da resistência armada, já famosos”, ressalva. Para ele, essa história começará a ser firmada na historiografia com a estreia do filme na 38º Mostra Internacional de Cinema. Vandré Fernandes revela ainda que está trabalhado com ideia de lançar um aplicativo para celular — um game — e um livro com o roteiro do filme.
Papel educacional
A diretora Ana Petta também comentou a experiência de dirigir o longa-metragem. Filha de militantes da resistência democrática à ditadura militar, ela revela que ao ser procurada por Vandré Fernandes com a ideia do filme suas lembranças da infância foram imediatamente despertadas. “Conheço a Guerrilha do Araguaia desde criança e sempre soube que o Osvaldão era um de seus líderes. Para mim, essa história sempre foi apaixonante”, comenta, acrescentando que ao ver as imagens do documentário “Encontro na antibabilônia” concordou com Vandré Fernandes que o assunto daria um longa-metragem. “Por onde o Osvaldão passou ele deixou a marca de uma figura extraordinária”, afirma, enfatizando que as lembranças dos que o conheceram são “um universo mitológico”.
Ana Petta falou também do empenho das entidades que patrocinaram o filme, para ela uma atitude que merece ser valorizada. “Houve um nível de engajamento muito forte no projeto, fundamental para conseguirmos os recursos que possibilitaram o lançamento do filme ainda em 2014, ano do cinquentenário do golpe militar de 1964”, diz ela, esclarecendo que a opção pelo caminho da obtenção de patrocínios foi uma alternativa à demorada burocracia para a busca de incentivos públicos. Segundo Ana Petta, o filme será inscrito em festivais nacionais e internacionais, e 2015 irá para o circuito nacional. “Depois disso, ele certamente continuará sendo exibido em escolas, entidades populares e em outros lugares, dado o seu papel educacional”, concluiu.

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